A caminhonete vermelha

    Sandra achava aquele silêncio extremamente desconfortável. Estava acostumada com todo o caos e pandemônio que o mundo se transformara agora e, ao ficar presa naquele lugar, percebeu o quanto o silêncio agora a incomodava. Sabia que aqueles bichos estavam lá fora e sabia que eles estavam planejando algo, sempre planejavam, foi assim que ela acabou onde estava.

O lugar era um galpão velho, agora abandonado, onde conseguira trancar a porta com alguns pedaços de ferro que estavam no chão. Sandra checou as janelas. Ela sabia que era sempre bom checar as janelas. Estavam fechadas com tabuas de madeira bem pregadas. Então sabia que alguém estava lá dentro. O que não representaria algo realmente bom, suas experiências anteriores lhe lembravam como as pessoas tendem ficar meio fora de si quando ficavam trancadas por muito tempo.

Pegou o seu querido e inseparável 48 e se preparou para o pior. Já sabia que alguém estaria ali, só não sabia se era alguém que queria que ela estivesse ali.

Foi andando cautelosamente pelo espaço mal iluminado torcendo para que ela visse algo antes que esse algo a visse. Então viu algo que não acreditou que realmente fosse o que ela via.

Um carro. Mais precisamente uma caminhonete. Vermelha. E isso foi o que mais chamou sua atenção. E uma daquelas bem antigas, que ela só via em filmes antigos dos anos 50.

Aproximou-se cautelosamente observando cada canto que pudesse ter alguém usando aquela caminhonete como isca em uma armadilha sórdida e finalmente viu que a surpreendeu. Havia alguém dentro da caminhonete. “Porra!” Agora sabia que era uma armadilha e ela caiu como uma otária. “Me ferrei agora...”.

- Ei! Calma! Eu estou só fugindo sabe? Você sabe como as coisas estão lá fora não é? Eu vou embora agora e deixo você em paz tá? – Disse isso levantando os braços e segurando sua arma para cima.

Nada. Nenhuma ação da outra pessoa. Talvez estivesse dormindo dentro do carro. Sandra foi se aproximando lentamente olhando fixamente para a pessoa lá dentro.

- Tá tudo bem?

Nada de novo. A tensão de Sandra aumentou ainda mais, decidiu que a melhor coisa a fazer era abrir a porta. Querendo ou não sua única chance de sair de lá com vida era dentro daquele carro.

Abriu a porta com rapidez e já apontou sua arma para dentro. Havia uma pessoa lá dentro. Parecia morta, não sabia dizer. Quando Sandra se aproximou para ver se estava tudo bem aquela pessoa abriu os olhos e soltou um grunhido indefinido. Então o extinto de sobrevivência já aguçado por todos os acontecimentos que a perturbaram até aquele momento falou mais alto.

Empurrou o corpo para fora e lhe deu um tiro na cabeça espalhando os miolos e sangue pelo chão. “Foda-se!”, pensou, não poderia arriscar numa hora dessas. Com tantos desses lá fora como não dizer que um deles veio parar aqui dentro.

Entrou logo na caminhonete e percebeu, para seu alivio, que a chave estava no contato. Girou a chave para dar a partida rezando para que pegasse e o carro tivesse combustível para isso.   

Ouviu o ronco do motor como uma música. Engatou a marcha e saiu quebrando a porta daquele maldito galpão. Havia muito tempo que não se sentia tão excitada assim. Acabou atropelando uns três daqueles monstros no processo. Alguns deles a perseguiram um pouco até ela ganhar velocidade e deixá-los para trás de uma vez por todas.

Sandra tinha conseguido escapar deles dessa vez. Sabia que tinha sido sorte sair com vida daquele lugar, mas o inferno estava em toda parte, e sabia que não conseguiria escapar para sempre.

Material enviado pelo leitor Mario Mansano, Professor de História, nerd e, periodicamente, escritor.